26 de fevereiro de 2010

Império Serrano


História todas as escolas de samba têm: foram fundadas por uma pessoa ou por um grupo, enfrentaram dificuldades no começo, cresceram, se firmaram, ganharam títulos... Mas eu não conheço uma história mais bonita que a do Império Serrano, porque ela está ligada ao desejo de justiça, democracia e participação. Tudo começou no Prazer da Serrinha. O nosso pessoal saía nessa escola, comandada por Alfredo Costa. “Seu” Alfredo era o dono, mandava e desmandava, e no carnaval de 46 chegou ao cúmulo de desprezar na hora do desfile o samba Conferência de São Francisco, de Silas de Oliveira e Mano Décio da Viola, que fora ensaiado com antecedência e feito especialmente para “contar” o enredo apresentado pela escola, o que na época era novidade. “Seu”Alfredo cismou, de repente, de mandar cantar um antigo samba de terreiro, No alto da colina, e o resultado foi a péssima colocação da escola, uma das favoritas naquele ano.

O nosso pessoal achou que era demais. Sebastião de Oliveira, o Molequinho, com seus irmãos, compadres e amigos, resolveu fundar uma escola de samba que fosse inovadora em tudo. E principalmente na questão de ninguém poder dar ordens que não admitissem discussão, de ninguém ter de abaixar a cabeça mesmo sem concordar. Adeus, seu Alfredo Costa. Adeus, Prazer da Serrinha. Agora todo mundo vai poder opinar, todo mundo vai querer ser ouvido: nascia o Império Serrano. Era 23 de março de 1947.

Foi na casa da Dona Eulália, na Rua Balaiada, no coração do morro da Serrinha, que a idéia de Molequinho se tornou realidade: saiu reunindo num caderno as assinaturas dos que o apoiavam. O nome foi sugerido por ele, mas na escolha das cores ele foi voto vencido – era, enfim, a democracia que chegava – e prevaleceu a sugestão do compositor Antenor, pintando de verde e branco o morro da Serrinha, o subúrbio de Madureira e o carnaval carioca.

Para a existência da nova escola foi fundamental o apoio e a experiência de Elói Antero Dias, líder comunitário de grande importância para a consolidação da cultura brasileira em nossa cidade. Como seu genro João de Oliveira, conhecido como João Gradim, irmão de Molequinho e D. Eulália, foi o primeiro presidente da nova agremiação, o Mano Elói, como era chamado, não poupou esforços para que o Império Serrano se impusesse, desde o primeiro momento, como algo novo e diferente.

Mas ninguém poderia prever naquele instante que a escola que nascia iria ser nove vezes campeã do carnaval carioca e assumir uma importância cultural bem maior do que simples resultados de desfiles.

O Império Serrano nasceu sob o signo da liberdade de expressão, de opinião. E esta luta continua até hoje. Todo mundo quer falar, todo mundo briga quando algum candidato a déspota tenta calar a nossa voz. A império-serranidade fala mais alto e ninguém abaixa a cabeça, não. Por isso, nunca tivemos um dono, ou patrono, fenômeno comum hoje em dia e que ajudou tantas co-irmãs a crescerem. Mas temos muitos donos: os sócios, os freqüentadores, os torcedores, os admiradores desta linda história, que a gente vai escrevendo a cada ano não sem dificuldades – a democracia tem seu preço – mas com muita paixão, que é coisa que não falta neste abençoado pedaço de chão entre Madureira e Vaz Lobo.

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